“As Esposas de Jacó”, escrito por Marek Halter, é um romance histórico que reinterpreta de forma poética e emocionalmente intensa as narrativas femininas presentes no Gênesis. O autor, conhecido por sua habilidade em dar voz às mulheres da Bíblia, concentra-se aqui nas vidas de Lia, Raquel, Zilpa e Bila — quatro mulheres ligadas por amor, dor, maternidade e espiritualidade ao patriarca Jacó, figura central da tradição judaico-cristã.
A obra é construída em quatro partes, cada uma narrada sob a perspectiva de uma das esposas. Esse recurso literário confere profundidade psicológica às personagens, permitindo que o leitor mergulhe nas suas emoções mais íntimas, nos seus dilemas pessoais, em seus sonhos, medos e esperanças. A história se passa num tempo antigo, mas os sentimentos retratados — ciúmes, amor, resignação, rivalidade, desejo de reconhecimento — são profundamente humanos e atemporais.
Lia, a primeira esposa de Jacó, é retratada como uma mulher digna e resignada, marcada pela dor de não ser amada. Ainda assim, sua maternidade torna-se uma forma de exercer poder e garantir seu espaço. Raquel, irmã de Lia, é a amada de Jacó, mas carrega o fardo da infertilidade, da inveja velada e das exigências emocionais do amor exclusivo. Já Zilpa e Bila, servas dadas como esposas secundárias, vivem um drama de submissão social, mas Halter lhes confere humanidade e profundidade, revelando suas angústias silenciosas e o desejo de se tornarem mais do que meras peças no tabuleiro patriarcal.
Halter se apoia na tradição bíblica, mas também a amplia com liberdade criativa, pesquisa histórica e sensibilidade moderna. O texto questiona a desigualdade de gênero e as estruturas de poder, mesmo quando ambientado num mundo em que a mulher era vista como posse ou moeda de troca. A maternidade, tema central da obra, aparece como benção, missão e também instrumento de disputa, numa sociedade que via nos filhos a continuidade e a benção divina.
O livro não é apenas uma reinterpretação religiosa — é também uma obra literária que mistura espiritualidade, história e psicologia. Com sua escrita envolvente, Marek Halter resgata essas figuras femininas do silêncio e da sombra, dando-lhes uma voz potente e sensível, ao mesmo tempo humana e sagrada.