“Fábulas Incompletas”, de Millôr Fernandes, é uma coletânea de histórias curtas publicadas em 1964, que revisitam o tradicional formato das fábulas, mas com uma abordagem subversiva, humorística e crítica. Millôr, conhecido por seu estilo mordaz e sagaz, utiliza essas histórias para satirizar aspectos da sociedade, política e comportamento humano.
Ao contrário das fábulas clássicas, que tradicionalmente trazem uma moral ao final, as “Fábulas Incompletas” quebram essa expectativa. Millôr desconstrói a forma tradicional ao deixar as histórias sem uma conclusão clara ou sem uma moral explícita, refletindo sua visão crítica de que a realidade muitas vezes não tem respostas simples ou finais satisfatórios. Esse uso do “incompleto” é um recurso literário que enfatiza a complexidade e a ambiguidade da vida.
Cada fábula na obra é repleta de trocadilhos, jogos de palavras e ironias afiadas, marcas características do estilo de Millôr. As histórias são curtas, mas densas em significado, exigindo do leitor um olhar atento e um senso de humor afinado para captar as nuances satíricas. Com temas que vão desde a política até as relações interpessoais, o autor aproveita o formato leve da fábula para fazer críticas profundas à sociedade.
A crítica social presente nas “Fábulas Incompletas” é atemporal. Millôr utiliza animais, como na tradição de Esopo ou La Fontaine, para representar diferentes tipos de personagens e situações, mas os enredos são frequentemente deslocados para cenários mais modernos e urbanos, fazendo com que as histórias reflitam sobre a vida cotidiana, o poder e a hipocrisia. Assim, ele usa o humor para expor as falhas da sociedade, mostrando que, muitas vezes, as soluções para os problemas do mundo são tão incompletas quanto as próprias fábulas que ele narra.
A obra de Millôr, sempre provocativa e irreverente, permanece relevante não só pela criatividade narrativa, mas também pela maneira como aborda questões humanas de forma crítica e divertida. “Fábulas Incompletas” é, portanto, uma obra que desafia o leitor a pensar além da superfície, a questionar as “morais” fáceis e a abraçar a incerteza como parte da experiência humana.