“Quincas Borba”, de Machado de Assis, é um romance que faz parte do período realista da literatura brasileira e explora temas como a natureza humana, a ambição, a moralidade e as complexas relações sociais. A obra foi publicada originalmente em 1891 e é uma das mais importantes dentro da vasta produção do autor, sendo a segunda parte da chamada trilogia realista, que começa com “Memórias Póstumas de Brás Cubas” e termina com “Dom Casmurro”.
A história gira em torno de Rubião, um homem simples e ingênuo que, após herdar uma fortuna de Quincas Borba, um ex-felizardo, se vê envolvido em uma série de situações que questionam sua ética e valores. Quincas Borba, que aparece como um personagem peculiar e excêntrico, morre logo no início da narrativa, deixando sua herança para Rubião, mas com uma condição curiosa: Rubião deveria seguir a filosofia de Quincas, conhecida como “Humanitas”, que prega a sobrevivência do mais forte.
A filosofia de Humanitas é um dos principais elementos de reflexão da obra. Machado de Assis utiliza essa ideia para criticar a sociedade brasileira da época e expor a falibilidade das ideologias que tentam justificar comportamentos egoístas e destrutivos. A doutrina, com sua ênfase na supremacia do indivíduo, leva Rubião a tomar decisões que, ao longo do romance, o afastam cada vez mais da realidade e da moralidade tradicional, fazendo com que ele perca a racionalidade e se envolva em um ciclo de degradação.
O romance é repleto de ironia, uma das características mais marcantes do estilo machadiano. A narrativa de “Quincas Borba” é um estudo profundo das fraquezas humanas, principalmente do desejo de ascensão social, da ganância e da luta pelo poder. Rubião, que inicialmente parece ser um personagem digno e honesto, se transforma ao longo da trama, à medida que a fortuna e as filosofias de Quincas Borba o influenciam. A sua ascensão social e financeira o leva a perder a conexão com seus próprios valores, e ele começa a adotar comportamentos que, antes de sua riqueza, jamais imaginaria.
Outro ponto importante da obra é o retrato de personagens secundários, como Cristina, que também é uma figura de grande interesse, e a esposa de Rubião, Sofia, que representa o outro lado da moeda das relações sociais. Cristina, que é uma mulher atraente e manipuladora, acaba se envolvendo com Rubião e, como muitos outros personagens, explora o seu desejo de ascensão e status social. Já a esposa de Rubião, representa a razão e o equilíbrio no momento em que o protagonista está se distanciando do senso comum.
Além disso, “Quincas Borba” explora a hipocrisia da sociedade carioca da época, com um olhar crítico sobre as aparências e as expectativas sociais. A obra mostra, com grande profundidade psicológica, como o ser humano pode ser facilmente levado a se corromper pelo poder, pela riqueza e pela busca incessante de status. O romance também aborda questões existenciais, como o valor da vida e da morte, a busca por sentido em um mundo aparentemente desprovido de valores absolutos.
O desfecho de “Quincas Borba” é tragicômico, um reflexo da ironia com que Machado de Assis constrói a obra. O destino de Rubião é o de um homem que, ao tentar se ajustar aos ideais e filosofias que adotou, acaba perdendo-se completamente. Seu fim, cercado pela solidão e pela desilusão, é um retrato das consequências de suas escolhas, que são resultado de uma vida pautada pela ilusão da superioridade e da busca desenfreada por poder.
O humor negro presente em “Quincas Borba” é uma das chaves para entender a obra, pois, embora a história seja densa e repleta de críticas sociais e morais, ela também nos apresenta momentos de uma ironia refinada, que tornam o romance mais complexo e profundo. Machado de Assis, com sua habilidade única, não apenas cria uma narrativa envolvente, mas também oferece um espelho das inquietações e disfarces da sociedade brasileira de sua época.
Em resumo, “Quincas Borba” é uma obra-prima de Machado de Assis, que explora com maestria a psicologia humana, as críticas sociais e a moralidade, utilizando uma abordagem irônica e profunda. Ao seguir a jornada de Rubião, o leitor é conduzido por uma reflexão sobre os limites da ambição, da ganância e da busca por um status que, muitas vezes, pode levar à destruição do próprio ser.