“Torto Arado” é um romance que se destaca pela sua profundidade emocional e pela forma como aborda questões sociais e históricas do Brasil. A narrativa se passa no sertão da Bahia, em uma fazenda chamada Água Negra, onde vivem trabalhadores rurais descendentes de escravos. A história é centrada nas irmãs Bibiana e Belonísia, que desde a infância compartilham um laço indissolúvel.
O enredo começa com um incidente marcante: enquanto exploram o baú da avó, as meninas encontram uma faca e, em um acidente trágico, Belonísia perde a língua. Este evento traumático molda a vida das irmãs e simboliza a perda de voz de muitos que vivem em condições de opressão. Bibiana, por um tempo, torna-se a porta-voz de Belonísia, e essa dinâmica entre elas é explorada ao longo do livro.
A narrativa é dividida em três partes, cada uma oferecendo uma perspectiva única. Na primeira parte, Bibiana narra sua visão da vida na fazenda e as dificuldades enfrentadas pela comunidade. Ela descreve a luta diária pela sobrevivência e a resistência contra a exploração dos proprietários de terra. A segunda parte é narrada por Belonísia, que, apesar de sua limitação física, revela uma força interior e uma conexão profunda com a terra e suas raízes ancestrais.
A terceira parte do livro é narrada por um espírito ancestral, que oferece uma visão mais ampla e espiritual da história. Este narrador onisciente conecta o passado e o presente, destacando a continuidade da luta pela terra e pela dignidade. A presença deste narrador espiritual reforça a ideia de que a história das irmãs e de sua comunidade é parte de uma luta maior e contínua.
Itamar Vieira Junior utiliza uma linguagem rica e poética para dar vida aos personagens e ao cenário do sertão. Ele captura a beleza e a dureza da vida rural, ao mesmo tempo em que critica as injustiças sociais e a exploração dos trabalhadores. O autor também explora a espiritualidade e as tradições culturais das comunidades quilombolas, destacando sua resiliência e resistência.
“Torto Arado” é uma obra que ressoa profundamente com os leitores, não apenas por sua narrativa envolvente, mas também por sua relevância social e política. O romance convida à reflexão sobre a história do Brasil, a luta por direitos e a importância da memória e da identidade cultural. É uma leitura poderosa que ilumina as vozes daqueles que muitas vezes são silenciados e esquecidos.