“Angústia” é um dos mais importantes romances de Graciliano Ramos, publicado em 1936, e é considerado uma das obras-chave do modernismo brasileiro. O livro mergulha nas profundezas da psique humana, explorando as inquietações, as frustrações e as percepções distorcidas de seu protagonista, Louis, um homem atormentado por suas próprias emoções e pelas circunstâncias de sua vida. A obra faz parte do período de maturação da escrita de Graciliano Ramos, um autor que se destaca por seu estilo conciso e realista, e por sua habilidade em retratar o lado mais sombrio da condição humana.
A narrativa de “Angústia” é conduzida em primeira pessoa, com o protagonista Louis como narrador. Ele é um homem introspectivo e solitário, com um interior cheio de angústias existenciais e conflitos internos. A história se desenrola a partir das reflexões e dos dilemas que ele enfrenta no dia a dia, especialmente no contexto de sua relação com as outras pessoas. A relação de Louis com sua esposa, sua filha e outros personagens é marcada por um profundo distanciamento emocional, criando uma atmosfera de incompreensão e desconforto.
A angústia de Louis está diretamente ligada ao seu sentimento de alienação. Ele sente-se perdido dentro de sua própria vida, incapaz de estabelecer uma conexão verdadeira com os outros, como se estivesse preso a uma realidade opressiva e imutável. A descrição da sua vida cotidiana, em que ele tenta, sem sucesso, encontrar significado ou alívio para sua dor interna, é marcada por uma linguagem crua e de difícil expressão, como se ele próprio estivesse lutando para entender e exprimir seus próprios sentimentos.
Em sua narrativa, Graciliano Ramos utiliza uma linguagem direta e seca, sem rodeios, refletindo a tensão emocional que permeia o romance. O estilo é marcado pela sobriedade, pela ausência de floreios e pelo uso de frases curtas e incisivas. Isso contribui para criar uma atmosfera de opressão, onde o leitor é convidado a acompanhar os processos mentais do protagonista, mas também a sentir a mesma angustiante claustrofobia que ele sente.
Outro elemento central da obra é o modo como Louis lida com sua percepção da vida e das pessoas ao seu redor. Ele se vê como uma vítima das circunstâncias, e sua dificuldade em se relacionar com os outros é uma fonte constante de frustração. Sua esposa, Eugênia, é um reflexo da mulher idealizada, mas que ele não consegue compreender e com quem mantém uma relação fria e distante. Ao mesmo tempo, a relação dele com a filha é ainda mais complicada, marcada pela falta de afeto e de qualquer tipo de vínculo emocional genuíno.
A angústia existencial de Louis também está ligada ao ambiente social e político em que vive. O romance não apenas trata das questões psicológicas do personagem, mas também do cenário de uma sociedade brasileira que, no momento de sua publicação, estava em processo de intensas transformações e turbulências. A desesperança e a sensação de impotência de Louis podem ser vistas como um reflexo do clima de incerteza que pairava sobre o país durante os anos 1930, um período de instabilidade política e econômica.
Um dos pontos mais impressionantes da obra é o modo como Graciliano Ramos constrói a atmosfera da angústia. A narrativa se desenrola de forma fragmentada e não linear, à medida que Louis reflete sobre sua vida, seus sentimentos e suas frustrações. O fluxo de consciência, uma técnica literária usada com grande competência pelo autor, dá ao leitor um vislumbre das profundezas da mente do protagonista, revelando suas inseguranças, suas paranoias e seus momentos de lucidez. Esse estilo contribui para a sensação de desorientação, como se o próprio Louis estivesse à deriva dentro de sua própria mente.
O clima de desesperança é ainda intensificado pela incapacidade do protagonista de mudar ou de encontrar uma saída para a sua angústia. Ele está preso em um ciclo de autossabotagem, incapaz de se libertar das limitações que ele próprio impõe a si mesmo. Sua jornada é uma busca constante por algo que possa aliviar sua dor, mas a cada tentativa, ele se vê mais profundamente enredado em seus próprios sentimentos de impotência.
“Angústia” é, assim, uma obra profundamente psicológica, que expõe a complexidade da alma humana de maneira brutal e sem concessões. Graciliano Ramos consegue, através da figura de Louis, representar as tensões internas que todos os indivíduos podem experimentar em algum momento da vida, sejam elas relacionadas à solidão, à incapacidade de se relacionar, ao medo do fracasso ou à falta de controle sobre o próprio destino.
Em resumo, “Angústia” é um romance que, apesar de sua aparente simplicidade de enredo, mergulha em questões profundas e universais da condição humana. A obra é um retrato de uma mente dilacerada pela dúvida e pela desesperança, e o estilo seco e preciso de Graciliano Ramos torna essa exploração ainda mais intensa. A angústia do protagonista ressoa como uma crítica ao vazio existencial que permeia tanto as relações pessoais quanto o contexto social mais amplo, fazendo deste romance uma das mais poderosas representações literárias da luta interna contra as limitações do ser.