“As Netas de Lilith”, publicado por Rosiska Darcy de Oliveira, é uma obra essencial para quem busca compreender as transformações do feminino no século XX e suas reverberações no presente. Com um texto poético, filosófico e político, Rosiska traça um percurso que entrelaça mitologia, história e emancipação, evocando Lilith — a figura mítica da mulher que se recusou a submeter-se — como símbolo ancestral da rebeldia feminina.
Logo no início, a autora apresenta Lilith como arquétipo da mulher que ousa desejar liberdade. Ao rejeitar o papel submisso imposto por Adão, Lilith se torna uma metáfora para a ruptura com os modelos patriarcais. A partir dessa figura, Rosiska constrói a ideia das “netas de Lilith”: mulheres contemporâneas que seguem questionando as normas estabelecidas, desafiando expectativas e reinventando modos de ser no mundo.
A narrativa de Rosiska Darcy de Oliveira combina reflexão intelectual com lirismo, permitindo que temas como maternidade, sexualidade, criação, opressão e autonomia feminina sejam abordados com sensibilidade e profundidade. O texto não se prende a categorias rígidas — é ao mesmo tempo ensaio, manifesto e contemplação.
Um dos pontos centrais da obra é o elogio à diferença: a autora rejeita modelos de emancipação baseados na imitação do masculino, propondo um feminismo que celebre o feminino em sua especificidade. Nesse sentido, “As Netas de Lilith” se distancia de uma visão utilitária da igualdade, propondo uma libertação que reconhece o corpo, o afeto, a linguagem e a subjetividade como territórios de resistência.
Rosiska também traça conexões entre a luta das mulheres e a transformação da cultura e da linguagem. Para ela, as netas de Lilith não apenas buscam novos direitos — elas também constroem novas formas de viver, de narrar o mundo e de amar. A linguagem, inclusive, é um dos grandes temas do livro: a autora insiste na necessidade de romper com os discursos que silenciaram ou deformaram a experiência feminina ao longo dos séculos.
Ao longo da obra, há uma convocação à escuta — escuta das vozes antes caladas, das histórias esquecidas, das potências do invisível. Nesse movimento, Rosiska Darcy de Oliveira confere dignidade à experiência feminina em todas as suas dimensões, mostrando que a emancipação verdadeira só se realiza quando inclui alma, memória e desejo.
“As Netas de Lilith” não é apenas uma obra sobre o feminino — é um livro que inspira transformação. Ao evocar o mito para pensar o presente, Rosiska oferece um horizonte de liberdade criativa, onde a mulher não é um espelho do outro, mas criadora de si mesma.
Ler esta obra é abrir-se ao gesto radical de imaginar um mundo em que a diferença não seja motivo de exclusão, mas fonte de renovação. E, acima de tudo, é reconhecer que as netas de Lilith seguem vivas, insubmissas — e indispensáveis.