“Um Beijo de Colombina”, de Adriana Lisboa, é um romance sensível e poético que mistura lirismo, memória e amadurecimento. A obra acompanha a trajetória de Eugênia, uma jovem que vive entre o presente e as lembranças de um passado marcado por descobertas, perdas e experiências afetivas intensas. A narrativa se desenvolve com ritmo delicado, revelando aos poucos os fragmentos de uma vida em construção.
Eugênia é uma adolescente introspectiva, curiosa e apaixonada por literatura. Sua história se passa no Rio de Janeiro, num contexto urbano cotidiano que contrasta com o tom onírico e melancólico de suas reflexões internas. Ela vive com a mãe, uma mulher forte e silenciosa, e carrega consigo a ausência do pai, que abandonou a família quando ela ainda era pequena.
O título do livro remete à personagem Colombina da commedia dell’arte, uma figura que simboliza graça, mistério e também um certo tipo de sedução. Para Eugênia, essa figura funciona como um símbolo de liberdade e desejo, algo que ela procura compreender em meio às inquietações da adolescência. O “beijo de Colombina” representa, portanto, a promessa do amor, da arte e da liberdade feminina.
A protagonista vive intensamente as pequenas experiências do dia a dia, como leituras, caminhadas, conversas e descobertas amorosas. Adriana Lisboa transforma esses momentos em acontecimentos literários, cheios de metáforas e significados. A linguagem do livro é poética e fluida, criando uma atmosfera de sonho e leveza, mesmo quando trata de temas dolorosos, como a solidão e a ausência paterna.
O primeiro amor de Eugênia tem grande importância na narrativa, representando tanto um rito de passagem quanto uma experiência de autoconhecimento. Esse relacionamento é narrado com ternura e ambiguidade, mostrando como a jovem busca compreender o próprio corpo, seus desejos e o impacto do outro em sua identidade. Não há idealização: há dúvidas, medos e a beleza da descoberta.
Outro aspecto marcante é a relação entre Eugênia e a literatura. Ela lê muito, escreve diários e se vê como alguém em constante transformação. A palavra escrita é refúgio e ponte para o mundo. Adriana Lisboa faz da própria narrativa uma celebração da linguagem literária, com frases delicadas e sensíveis que capturam as nuances da experiência feminina juvenil.
A relação com a mãe também tem destaque. As duas vivem uma convivência silenciosa, mas cheia de gestos simbólicos. Aos poucos, Eugênia começa a entender melhor os sacrifícios e escolhas dessa mulher forte e discreta, reconhecendo nela uma história de resistência e amor que vai além das palavras. É um vínculo silencioso, mas profundo.
O carnaval surge como metáfora da vida, com suas máscaras, cores e transitoriedade. É durante esse período festivo que Eugênia vive momentos decisivos. A fantasia de Colombina que ela usa em um baile torna-se símbolo de sua transformação, de seu despertar para a feminilidade e da aceitação da complexidade da existência.
“Um Beijo de Colombina” é, assim, uma história de amadurecimento, mas também um livro sobre palavras, silêncio, memória e reinvenção. Com sua prosa refinada e intimista, Adriana Lisboa oferece ao leitor um mergulho na sensibilidade de uma jovem que busca compreender a si mesma e o mundo que a cerca, descobrindo que crescer é, em parte, aprender a se narrar.