“O Salto”, de Léon Werth, é uma narrativa curta e intensa que convida o leitor à reflexão profunda sobre o medo, a liberdade e a tomada de decisões em situações-limite. A história gira em torno de um simples ato físico — um salto — mas que carrega um peso simbólico gigantesco, tornando-se uma metáfora para escolhas que definem destinos.
A trama acompanha um soldado em meio à Primeira Guerra Mundial, um ambiente onde a vida está constantemente ameaçada e cada gesto carrega consequências irreversíveis. Em determinado momento, esse soldado se vê diante de um penhasco. A única maneira de escapar de um bombardeio iminente ou de capturadores inimigos é saltar. O salto, nesse caso, não é apenas físico, mas existencial.
O autor mergulha na mente do personagem com extrema sensibilidade, expondo suas hesitações, seus pensamentos fragmentados, seus temores e lembranças. Werth mostra como, em um segundo de decisão, o cérebro pode revisitar uma vida inteira. O soldado pensa em sua infância, na mãe, em um amigo, na sensação do vento, no medo de cair — e, ao mesmo tempo, no medo de não saltar.
Esse conflito interno é o que dá força ao texto. A dúvida entre o instinto de preservação e a coragem do salto traduz uma tensão existencial: a escolha entre o risco de morrer tentando escapar e a morte certa se permanecer imóvel. Werth trabalha esse dilema com uma linguagem contida, mas profundamente emocional, conferindo ao leitor a sensação de estar no mesmo limiar.
A história se torna, então, uma alegoria para qualquer situação humana em que seja necessário romper com o conhecido para enfrentar o desconhecido. Saltar, neste caso, é romper com a paralisia, com o medo, com a ilusão de segurança. É um grito silencioso pela liberdade, mesmo que ela venha carregada de perigo.
Léon Werth era amigo íntimo de Antoine de Saint-Exupéry, e há ecos dessa amizade em sua escrita: a mesma sensibilidade diante do sofrimento humano, o mesmo olhar terno para o indivíduo solitário em meio a uma sociedade ou guerra impiedosa. Em “O Salto”, Werth não glorifica o heroísmo, mas humaniza o medo e o peso de uma escolha urgente.
O ambiente de guerra não é descrito com ênfase nos horrores explícitos, mas sim como uma presença opressora e constante. Isso permite que o foco esteja sempre no íntimo do personagem, reforçando o estilo psicológico da narrativa. Não se trata de uma história de ação, mas de consciência — daquelas que se desdobram inteiras em uma fração de segundo.
Ao final, Werth não entrega um desfecho claro. O leitor é deixado em suspense: o salto ocorreu? O soldado sobreviveu? Essa ambiguidade não é um descuido, mas uma escolha estética e filosófica. O que importa não é o resultado, mas a disposição de arriscar — ou de permanecer imóvel, esperando o pior.
“O Salto”, portanto, é uma pequena obra-prima que fala de coragem, de escolha e de liberdade, escrita com a precisão e humanidade características de Léon Werth. É uma leitura breve, mas que permanece ressoando na mente por muito tempo, como o eco de uma decisão que poderia ser a nossa.