Publicado em 1933, Doidinho é o segundo livro do chamado “Ciclo da Cana-de-açúcar”, de José Lins do Rego. A obra dá continuidade à trajetória de Carlos de Melo, personagem central de Menino de Engenho, agora enviado para um internato. O livro mergulha profundamente nas experiências emocionais, sociais e psicológicas da infância.
Ao sair do ambiente rural do engenho Santa Rosa e ir para o colégio interno em Itabaiana, Carlos se depara com uma nova realidade: rígida, disciplinada e muitas vezes opressora. A saudade da liberdade do engenho é constante, assim como o sentimento de inadequação ao novo meio.
No colégio, apelidado de “Doidinho” pelos colegas, Carlos enfrenta agressões físicas e psicológicas. Os castigos dos professores, o autoritarismo da direção e as humilhações sofridas reforçam seu sentimento de solidão e revolta contra a instituição. Ele é sensível e criativo, o que o torna um alvo fácil para zombarias e incompreensão.
Apesar das dificuldades, Carlos encontra em alguns colegas e nas leituras uma forma de resistência. A paixão pelos livros surge como um abrigo interior, um espaço onde pode ser livre e sonhar. A leitura o afasta da brutalidade do cotidiano e alimenta seus desejos de fuga e transformação.
José Lins do Rego utiliza uma linguagem fluida e afetiva, marcada por um tom nostálgico e confessional. O autor revisita suas próprias experiências de infância e juventude, imprimindo grande realismo às cenas do internato. A narrativa em primeira pessoa aprofunda a identificação com o sofrimento do protagonista.
O título Doidinho simboliza como a sociedade lida com a sensibilidade e o inconformismo. O comportamento de Carlos, diferente dos padrões esperados, é taxado como “loucura”, revelando a intolerância com o que escapa da norma. O livro é, portanto, uma crítica ao modelo educacional autoritário da época.
Além disso, a obra trata da passagem da infância para a adolescência como um processo doloroso e marcado por perdas. Carlos não apenas se distancia de sua terra natal, mas também de uma infância idealizada, tendo que lidar com o crescimento sob coerção e repressão.
O contraste entre o engenho e o colégio é o fio condutor da obra: liberdade versus controle, afeto versus frieza, infância versus amadurecimento. Carlos emerge como um símbolo de resistência poética em meio a um mundo hostil.
Doidinho é um retrato delicado e amargo da formação de uma consciência crítica, um menino que se recusa a se dobrar diante da injustiça. É uma obra sobre a dor de crescer, mas também sobre a força da imaginação como forma de sobrevivência.