Em “Pedra que Fala”, Letícia Munhoz nos convida a escutar aquilo que, à primeira vista, parece mudo. A obra é uma travessia poética pela memória, pela ancestralidade e pela resistência, tomando a pedra como símbolo maior daquilo que resiste ao tempo e guarda as histórias esquecidas pela pressa do mundo moderno.
A autora constrói seu texto com delicadeza e profundidade, transformando a pedra em metáfora para as vozes silenciadas, especialmente femininas e ancestrais. O livro propõe uma escuta atenta da matéria do mundo, daquilo que permanece mesmo quando tudo ao redor muda. A pedra, aqui, é testemunha e também narradora.
Ao longo da obra, Letícia Munhoz desenvolve uma escrita que se aproxima da oralidade e da espiritualidade. As palavras soam como cantos antigos, rezas e ecos de tempos passados. A pedra ganha voz, não por milagre, mas por sensibilidade — a sensibilidade de quem sabe que tudo o que existe guarda uma história dentro de si.
O tempo é um personagem sutil no livro. Ele não corre — ele repousa sobre as superfícies. A pedra fala devagar, e Munhoz respeita esse ritmo. Cada poema, cada fragmento narrativo é uma tentativa de escavação da alma do mundo. A poesia, então, torna-se instrumento de arqueologia emocional e histórica.
A presença do feminino é uma constante poderosa em “Pedra que Fala”. São vozes de mães, filhas, avós e deusas antigas que se fazem ouvir. A pedra guarda os gritos abafados, os sonhos interrompidos e as vidas que resistiram mesmo quando não havia espaço para florescer. A autora dá corpo a essas presenças com lirismo e força.
A linguagem do livro é econômica, mas carregada de sentido. Letícia Munhoz prefere o sussurro à explosão. É na delicadeza que a pedra ganha forma e fala — e é nessa escuta silenciosa que o leitor é transformado. A cada página, somos convidados a parar, a refletir, a tocar o invisível com os olhos da alma.
Ao utilizar elementos da natureza como símbolo, Munhoz resgata também uma relação espiritual com o mundo. A pedra é, ao mesmo tempo, a Terra e a palavra; é resistência e ternura; é morte e renascimento. Ela fala não como quem impõe, mas como quem compartilha uma sabedoria que só o tempo pode oferecer.
O livro é, acima de tudo, um exercício de escuta. Em um mundo marcado pelo excesso de ruído e pela superficialidade, “Pedra que Fala” propõe o contrário: o silêncio atento, a pausa, a escuta das camadas mais profundas da existência. É uma obra que exige entrega do leitor, mas oferece em troca beleza, verdade e sensibilidade.
Ao final da leitura, resta a impressão de que não há nada verdadeiramente mudo. Mesmo as pedras têm o que dizer — basta que alguém, como Letícia Munhoz, saiba escutá-las. “Pedra que Fala” é, portanto, um livro sobre o tempo, sobre o corpo, sobre a memória, e sobre a linguagem que pulsa mesmo no que parece calado.