Publicado em 1893, “O Enjeitado”, de Inglês de Sousa, é uma obra marcante do Naturalismo brasileiro, ambientada na região amazônica e repleta de tensões sociais, dramas morais e reflexões sobre a exclusão, o preconceito e o destino humano. Escritor paraense, Inglês de Sousa foi um dos primeiros a levar para a literatura brasileira o universo da Amazônia, com seus costumes, conflitos e atmosferas únicas, criando uma narrativa rica em regionalismo e crítica social.
A história de “O Enjeitado” gira em torno de um protagonista marginalizado desde o nascimento, fruto de uma relação ilegítima, abandonado à própria sorte e estigmatizado pela sociedade. O título já antecipa o eixo temático: trata-se de um indivíduo que, por não se encaixar nas normas sociais e morais vigentes, é rejeitado, excluído e constantemente humilhado. A obra mostra a formação e o desenvolvimento desse personagem, marcado pelo rancor e pela solidão, que o levam a uma trajetória de dor, rebeldia e busca por justiça ou vingança.
Como é característico do Naturalismo, o romance explora o peso das heranças biológicas, do meio e das circunstâncias sociais sobre o comportamento humano. Inglês de Sousa traça, com precisão e densidade psicológica, o modo como o “enjeitado” vai se transformando sob a pressão da rejeição, tornando-se quase uma figura trágica, moldada pela violência do mundo que o cerca. A crítica à hipocrisia da elite local e à rigidez das estruturas familiares também está presente, revelando o autor como um observador atento e sensível às contradições da sociedade brasileira da época.
O pano de fundo amazônico — com seus rios, florestas, vilarejos e costumes locais — não é apenas um cenário exótico, mas parte fundamental da narrativa. A natureza, ao mesmo tempo bela e opressora, espelha o conflito interno do personagem e acentua o tom sombrio e fatalista da obra. A linguagem de Inglês de Sousa, ao mesmo tempo direta e refinada, valoriza o colorido regional sem perder o foco nos dilemas universais da condição humana.
“O Enjeitado” é um romance que, embora menos conhecido do grande público hoje em dia, merece lugar de destaque na literatura brasileira do século XIX. Pela força de sua crítica social, pela representação intensa de um personagem marcado pela dor da exclusão e pelo retrato vívido da Amazônia, a obra permanece atual, desafiando o leitor a refletir sobre temas como identidade, pertencimento e justiça social. Uma leitura essencial para quem deseja compreender as raízes do Naturalismo brasileiro e a diversidade de vozes que compõem nosso patrimônio literário.