Tiago Lemos Duarte constrói em “A Janela dos Pássaros” uma narrativa poética e introspectiva que mergulha no universo da memória, do tempo e da liberdade. O romance gira em torno de um protagonista silencioso, solitário, cuja vida é atravessada por lembranças fragmentadas observadas a partir de uma janela que dá para um jardim povoado por pássaros.
O autor faz uso de uma linguagem lírica e sensível, revelando uma forte influência da tradição lusófona, com ecos de José Saramago e Mia Couto. A janela se torna símbolo central da narrativa: é através dela que o personagem vê o mundo, revive o passado e sonha com o que poderia ter sido. Os pássaros, por sua vez, representam os desejos reprimidos, a liberdade inalcançada e os fragmentos da infância.
À medida que os capítulos avançam, o leitor é convidado a desvendar um quebra-cabeça emocional. O narrador intercala cenas do presente — geralmente monótonas e contemplativas — com memórias vivas, cheias de cor e sensações. Essa dualidade estrutura o romance e acentua a melancolia do protagonista, preso entre o que já foi e o que nunca virá.
Tiago Lemos Duarte também insere reflexões sobre a passagem do tempo, a perda e o poder da contemplação. A janela é um espaço liminar, entre o dentro e o fora, entre a realidade e o devaneio. Por meio dela, o personagem estabelece uma relação quase mística com os pássaros, que aparecem e desaparecem com as estações, acompanhando os ciclos emocionais da narrativa.
O ritmo do livro é propositalmente lento, como se imitasse o bater de asas dos pássaros ou o vento que atravessa a cortina da janela. Há poucas falas, mas muitos pensamentos e descrições carregadas de sensibilidade. O autor exige paciência do leitor, mas recompensa com imagens vívidas e uma atmosfera que beira o onírico.
Mesmo com sua densidade poética, “A Janela dos Pássaros” não se distancia das grandes questões humanas. Amor, luto, solidão e esperança aparecem como temas centrais. A janela, no fim, revela-se uma metáfora para o próprio ato de viver: olhar, esperar, lembrar — e, em certos momentos, ousar imaginar uma fuga.
A prosa de Tiago Lemos Duarte é delicada, mas firme. Ele não apela para grandes reviravoltas ou dramas exagerados. Sua força está na construção do íntimo, no que não é dito, no que se insinua nas entrelinhas. É um livro que se lê devagar, com o coração aberto e os sentidos atentos.
Ao fechar “A Janela dos Pássaros”, o leitor não encontra necessariamente respostas, mas sai transformado pela beleza de olhar o mundo — e a si mesmo — com mais poesia, como quem, em silêncio, contempla o voo de um pássaro ao longe.